Catolicismo de maneira inclusiva

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24 de março – Santo Óscar Romero, mártir

Imagem: Arquidiocese de São Paulo

Uma escolha “segura”

Em El Salvador, país caracterizado pela instabilidade econômica e desordens políticas, onde uma oligarquia rica governava um povo de maioria pobre e sem-terra, Óscar Arnulfo Romero y Galdámez, nascido em 1917, trabalhou como carpinteiro. Aos 13 anos, o jovem – tranquilo e estudioso – manifestou o desejo de ser sacerdote: entrou para o seminário e, mais tarde, foi enviado a Roma, para concluir seus estudos, onde recebeu a ordenação sacerdotal, em 1942.

Ao voltar para seu país, Padre Romero foi pároco, reitor de seminário e, enfim, Bispo auxiliar, enquanto as nuvens se tornavam cada vez mais escuras, no horizonte político salvadorenho: forças governamentais, grupos paramilitares e guerrilhas eram sempre mais violentos. Vários grupos de pobres oprimidos começaram a se organizar para denunciar a miséria em que viviam. Neste clima, Romero foi nomeado Arcebispo de San Salvador, em 1977. A sua escolha era considerada “segura”, pois como poderia um intelectual conservador, que falava de santidade, incomodar alguém?

Momento difícil

Após três semanas da sua tomada de posse, o amigo de Dom Romero, Padre Rutilio Grande, que prestava assistência aos agricultores empobrecidos, foi assassinado junto com um camponês idoso e um menino, cujos corpos foram expostos na catedral. Dias depois, Dom Romero disse: “Ao ver Rutilio, que ali jazia, pensei que eu também teria o mesmo fim”. Uma centelha de luz iluminou o novo Arcebispo sobre como resolver a situação e começou a entender o verdadeiro significado de santidade, à qual aspirava na sua juventude.

Padre Rutilio não foi o único a ser assassinado, impunemente, naqueles anos em El Salvador: todos os dias, desapareciam pessoas; os camponeses estavam aterrorizados; os sacerdotes e agentes pastorais, que queriam ajudar os pobres, eram torturados ou mortos. Então, o tranquilo Arcebispo começou a levantar sua voz, denunciando o governo de direita e a guerrilha de esquerda, inclusive o governo dos Estados Unidos, que fornecia armas, que matavam seu povo. Em suas homilias, Dom Romero apresentava listas semanais de pessoas desaparecidas, torturadas ou assassinadas, que contavam com mais ouvintes do que em qualquer outro programa de rádio do país.

O momento era difícil, como dizia o Arcebispo: “A autenticidade de um cristão se constatava na hora das dificuldades… Bendito seja Deus por este momento difícil em nossa arquidiocese. Peçamos-lhe a graça de sermos dignos desta situação”!

A coragem

Dom Romero toma as suas palavras de modo literal e até Deus, talvez, as leva a sério. No Evangelho, o Arcebispo encontra uma coragem maior que a humana e as palavras mais eloquentes, que qualquer uma inspirada pelo homem. Em suas homilias, ele falava de uma “única Igreja, daquela que Jesus pregou aos ricos e pobres, sem distinção… à qual devemos dar todo o nosso coração”; ele pregava “uma reforma interior sobrenatural, que não se traduzia em luta armada e que, como o Evangelho, deveria ter repercussões concretas no homem”.

O Arcebispo de San Salvador estava ciente de que aqueles mesmos soldados, que torturavam e matavam seu povo, eram cristãos, na sua grande maioria. Por isso, como pastor deles, dirigia-se a todos com a autoridade que lhe vinha do Senhor. Em 23 de março de 1980, fez uma pregação, pelo rádio, dirigindo-se diretamente a eles: “Nenhum soldado é obrigado a obedecer a uma ordem contrária à lei de Deus… Chegou a hora de tomar consciência… Pois isso, em nome de Deus e deste povo, que sofre há muito tempo, cujo grito sobe cada vez mais alto aos céus, eu lhes imploro, lhes rogo, em nome de Deus, para cessar a repressão”! O Arcebispo sabia que não podia falar assim e continuar vivendo…

O grão de trigo

No dia 24 de março de 1980, Dom Romero participou de um retiro espiritual para sacerdotes. Na Missa vespertina, que celebrou, disse: “Aqueles que se dedicam ao serviço dos pobres, por amor de Cristo, vivem como o grão de trigo que morre…”. Ao término da sua homilia, ao voltar ao altar, um homem armado entrou na igreja e o baleou.

Desta forma, Dom Óscar Romero tornou-se aquele grão de trigo, oferecendo seu sangue pela “redenção e ressurreição” do seu povo. Em 14 de outubro de 2018, usando o cíngulo manchado de sangue, que Romero usou na sua última Missa, o Papa Francisco declarou este Arcebispo mártir, Santo da Igreja.

Fonte: Vatican News. Acesso em: 02 abr. 2024.

10 de março – São João Ogilvie, sacerdote e mártir

Imagem: Wikipedia

Outono de 1613. O capitão Watson volta a lançar suas âncoras no cais de Leith, às portas de Edimburgo, após 22 anos de ausência. Até então, havia viajado por toda a Europa: França, Bélgica, Alemanha, Áustria, Boêmia e Morávia. O capitão era um homem culto, porque conseguiu estudar em todas as cidades por onde passava. Porém, decidiu voltar para casa e continuar seu trabalho, que não pôde fazer à luz do sol.

Clandestino do Evangelho

Na verdade, o “Capitão Watson” era João Ogilvie, um missionário jesuíta desconhecido, que havia desembarcado em uma terra que lhe é mãe e inimiga.

Vinte anos antes do seu nascimento, em 1579, a Escócia se tornara protestante e, para os católicos, a vida tornou-se muito perigosa. Celebrar ou participar de uma Missa podia custar a perda dos bens e o exílio e, os recidivos, pagavam com a vida. João sabia muito bem disso e, apesar de os seus superiores o terem transferido para Rouen, na França, por dois anos ele insistiu, em suas cartas ao Superior geral, Padre Cláudio Acquaviva, pedindo-lhe para voltar a viver com seus compatriotas. De fato, com a sua tenacidade, conseguiu regressar ao seu país. Em 11 de novembro de 1613, aquele clandestino do Evangelho começou sua nova missão.

Amor e traição

A vida de cada dia do Padre João era um contínuo desafio ao sistema. Celebrava Missa, antes do amanhecer, com alguns fiéis de confiança; depois, visitava os enfermos, os encarcerados; encontrava novos convertidos, mas até “hereges”, aqueles protestantes que queriam voltar ao catolicismo. Algumas vezes, dormia na casa de alguns deles e costumava recitar o breviário no quarto onde se hospedava. “Alguém que me espiava, me ouviu sussurrar, em voz baixa, à luz de vela, dizia que eu era um mago”, recorda Ogilvie em suas memórias.

No entanto foi traído precisamente por um “herege”, Adam Boyd, um cavalheiro de Glasgow, cidade onde o Jesuíta foi morar em outubro de 1614. Boyd fingiu querer reconciliar-se com a Igreja, ao invés, entregou o Padre João ao arcebispo anticatólico da cidade, que o mandou prender.

Fé férrea

O que se segue, recorda a noite que Jesus passou entre Quinta e Sexta-feira Santas. Uma noite que, para o Padre João, durou quatro meses: processos intercalados com torturas, constantemente acorrentado com perneiras de ferro, que o dilaceravam. Insultado e esbofeteado até pelo arcebispo, Padre João não cedeu um milímetro, pelo contrário respondia a todas as acusações. Ele foi insultado até por algumas famílias católicas, aprisionados por causa de uma lista de nomes encontrados entre os papéis do Jesuíta.

No entanto, ele não traía ninguém. Aliás, às vezes, era irônico e pungente com aqueles que o queriam dissuadir. E, quando a sua ameaça da morte se concretizou, disse: “Se eu pudesse, salvaria a minha vida, mas sem jamais perder a Deus; não podendo conciliar as duas coisas, sacrificaria o bem menor para ganhar o bem maior”.

Até o fim

Uma vez que a violência não o fazia ceder, tentaram seduzi-lo, oferecendo-lhe ricas rendas e até a mão da própria filha do arcebispo. Mas, nada o convencia o Jesuíta; ele rejeitava a apostasia, sem rejeitar a supremacia espiritual do Papa sobre aquela do rei, a quem ele acreditava governar a Igreja por direito divino.

Nestas alturas, Jaime I Stuart interveio na disputa, mandando enforcar Ogilvie, se ele continuasse a relutar em suas posições. A sentença foi formalizada na manhã de 10 de março de 1615 e executada à tarde. Mesmo já estando no patíbulo, – narra a crônica oficial do julgamento, – o Padre João empreende combate contra aqueles que o difamavam, acusando-o por crime de lesa-majestade. “Quanto ao rei – exclamava – eu daria, com prazer, a vida por ele! Saibam também que eu e outro meu amigo escocês agimos em benefício do rei no exterior; fizemos coisas tão importantes por ele que vocês, com todos os seus ministros, nunca conseguiriam fazer. Portanto, morro sim, mas somente pela minha fé”.

Os restos mortais de São João Ogilvie foram enterrados junto com os dos outros condenados e se perderam para sempre. Em 1976, o Papa Paulo VI o proclamou Santo.

Fonte: Vatican News. Acesso em: 06 mar. 2024.

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Por Mauro Nascimento